Estava me sentindo prá lá de Bagdá. Delírios de febre e calafrios, então meu irmão me arrastou até o médico - eu não queria ir, claro. Como estou na praia, tive que encarar a "emergência do postinho". Que maravilha. Na sala de espera o povo todo com aquelas "doenças de veraneio". O menino com bicho de pé. O senhor que disse que nunca entra no mar e justo naquele dia que resolveu se banhar, foi atacado por uma mãe d'água. Coitado. A mulher que berrava porque passou o braço num bicho cabeludo. Também tinha uma senhora que não apresentava nenhum sintoma mas estava ali só para bater papo. E eu me sentindo a pior das criaturas, querendo desaparecer daquele lugar trépido. Eis que a enfermeira abre a porta da sala de vacinação e grita: Alguém me ajuda. Tem um indivíduo aqui, agarrado numa garrafa de cachaça, atirado no chão. Olho pro meu irmão e imploro para que ele me tire dali. Ele me responde: Fica sentada aí, guria! Te aquieta que já vão te chamar! Nisso, sai carregado da sala de vacinação o tal indivíduo. Ele empinava uma garrafa de cachaça chamada Chinoca Minha. Não sei como que eu consegui pegar o nome da aguardente mas meu irmão me disse que é "canha das braba". Ana Flores! Sou eu. Me chamaram, graças a Deus.
- Muito prazer, Pedro, sou o médico de plantão.
- Oi.
Pedro me fez uma série de perguntas. Respondi prontamente, relatando todos os meus sintomas, com a certeza de que no final de tudo ele me diria que estou com uma virose. Parece que é só isso que os médicos sabem dizer ultimamente.
- Muito bem Ana, agora senta aí que vou te examinar.
- Sentar ou deitar?
- Sentar. Agora comece a respirar.
Pensei: Mas eu já estou respirando, senão estaria morta.
Então comecei a respirar de forma um pouco mais lenta, mais profunda, pausadamente, para facilitar o trabalho do médico. Minha linda respiração, com uma excelente expansão abdominal, intercostal e peitoral. Admirável. E o doutor me disse:
- Não, Ana. Respire pela boca, por favor.
- Pela boca, doutor?
- Sim, pela boca. Vamos lá...
- Mas doutor, a boca não seria para comer e o nariz para respirar?
Silêncio no consultório. Tranquei a respiração. O médico tirou o estetoscópio do ouvido. Eu continuava sem respirar. O mais absoluto silêncio.
- Hmm...tem razão. Nesse caso pode continar respirando pelo nariz mesmo, Ana.
- Obrigada, doutor. E posso continuar comendo pela boca também?
- Hã??
Depois disso a consulta correu bem. Escuta daqui, aperta dali e Pedro finalmente arriscou um diagnóstico:
- Aposto o meu diploma que você está com uma faringite viral. E ela está num estágio muito forte...
- Vou morrer, doutor?
- Vai, todos nós morreremos um dia. Mas espero que não morra aqui na minha frente, no meu consultório. Fica tranquila Ana, vou te dar uma medicação e tu vais melhorar em poucos dias...
Comecei a chorar na frente do Pedro. Ele me deu um lencinho de papel e deve ter me achado uma debilóide. Nos despedimos e o jovem doutor estimou as minhas melhoras. Saio do consultório e vejo que a senhora que não apresentava sintoma algum ainda estava por ali; ela tinha tirado a tarde para papear na sala de espera. Tinham duas novas crianças com bicho de pé e o bêbado estava com um braço enfaixado e com a Chinoca Minha embaixo do outro braço.
Voltei para casa com o maior febrão, sabe aquela febre que a gente tem quando é criança? Hoje já me sinto um tanto melhor, só dói quando eu falo e quando respiro. Ou seja... Mas que bom que não dói para engolir, já que não é problema nas amígdalas e sim na faringe. Assim, poderei continuar comendo...sempre pela boca!
6 comentários:
Aninha!
A cada texto seu, me torno mais seu fã :)
Beijos!
Obrigada, Hiro :)
Tá muito bom isso aí, e, olha, eu conheço a praia.
Ana,muito bom o texto......chorei de rir imaginando a cena.....melhoras amiga e siga respirando pelo nariz e comendo pela boca.....hehehhehe
incrível!! muito fã do teu texto!
eu lendo e imaginando tua cara!! vc sacudindo o cabelo, torcendo a boca para o lado e girando os olhos....com cara de interrogações!! hahahahahha
se eu não te conhecesse diria que isso tudo é uma ficção...mas, como convivo, acreditei em tudo. novela...das sete!
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